sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Continued...Lá No Palácio de Cristais (Ilusions II)


Nenhum dos dois pronunciava qualquer palavra… Ali estávamos duas almas e mais uma, que falava pelas três! O chá que outrora estivera quente, ia arrefecendo a cada palavra soletrada pela Sr.ª Omisha, os dois, nada dizíamos, anuíamos por vezes, baixávamos a cabeça, e fixávamo-nos de uma forma estranha, sem pudor, sem qualquer tentativa para desviar o olhar, fitávamos como animais que se estão a medir para um combate, como inimigos que medem armas… Mas quer no meu, quer no dele nada de rancor havia, só persistência, curiosidade talvez, um misto de insegurança com conhecimento de causas…
A Sr.ª Omisha, falava e falava, se fosse em uma outra altura estaria a sorrir para todas aquelas palavras que dizia com a jovialidade de uma criança sábia, mas não naquele momento, nem a ouvia, sabia que falava pelos movimentos do corpo, porém a minha atenção estava num outro alguém… Sentia o calor das faces, um formigueiro nos lábios, e sentia o olhar inquietante do homem na minha frente, olhos enormes de uma cor estranhamente indecifrável, não era azul, nem verde, era intenso, como um lago da Escócia, profundo, brilhante, inquietante, misterioso, feroz e ao mesmo tempo com um doçura, eram os olhos que me detinham mais que tudo, era a forma de olhar, não era a cor, nem o formato, nem as pestanas que rodeavam todo aquele lago, nem as sobrancelhas que lhe davam a forma de um felix, era o que deles saia, e o que deles provinha, era capaz de jurar que aquele olhar tinha séculos de existência, tinha um alma antiga, uma sabedoria de ancião, e isso mantinha-me ali fascinada, sabia perfeitamente quem era aquele ser que no reflexo do olhar se mostrava a mim cada vez mais claro, e nítido ser. Já não era necessário perguntar à Sr.ª Omisha que sonho tinha sido o meu, talvez já nada fosse necessário saber, pois no silencio da mente as respostas apareciam uma e outra…
Não sabia as coisas básicas o nome, que possivelmente a Sr.ª Omisha teria mencionado quando nos apresentou logo a seguir à minha entrada na casa dela, mas não me recordava de nada, a não ser de caminhar sem saber qual o pé que colocaria primeiro para dar um primeiro passo, mas lá fui colocando um e outro, até chegarmos todos à sala, e sentarmo-nos cada um no seu sofá bordeou com um naprom de renda a cobrir o encosto, já com os seus braços gastos das afiadinhas que o gato preto de olhos azuis fazia sempre que precisava de manicure _ Rodolfo ( o nome do gato), normalmente quando me sentia aproximar da casa, colocavas e a ronronar à Sr.ª Omisha, miava, e só quando estava muito frio não ia até a porta, até o som da campainha soar pela casa toda, sabia sempre quando eu vinha por perto, dizia a Sr.ª Omisha “Menina, o Rodolfo já te sentia, estava à tua espera!”; fazia-lhe umas festas enquanto ele caminhava ao meu lado até se deitar aos meus pés quando me sentava no tal sofá bordeou com naprom branco de renda, ficava ali horas sem fim, dependendo das conversas que podiam levar horas, lembro-me que certa noite, só paramos a conversa interminável às 5 da manhã, e já não fui para o Palácio dos Cristais, nessa noite ficara no quarto no neto da Sr.ª Omisha, que se vivia longe, mas por vezes regressava para ver a avó. Ali também o rosto tivera a atormentar-me o espírito…
Voltando ao presente… O gato não viera desta vez. Para romper o silencio, aclarei a voz e perguntei pelo Rodolfo, vi um sorriso sair do rosto do homem, vi como as suas enormes pestanas pretas se fechavam e abriam com a suavidade de uma pena, vi como uma covinha se formava no sorriso que os lábios esboçavam, vi depois o seu olhar meigo a olhar o meu de espanto.
“Este no paraíso dele!”
Olhei para ele ainda sem entender… Devo ter feito uma cara tão estranha que a Sr.ª Omisha interveio logo _ “Não, não minha menina! Ele está bem, está no outro sétimo céu dele! No quarto do meu neto, também me admiro não te ter vindo ver, aquele gato está a ficar velho, sabes?” Aliviada sorri para a Sr.ª Omisha. Os olhos da Escócia olhavam-me, parecia que me despia não só o corpo como a alma, estava a ser analisada por completo, sentia-o, e nunca gostara de tal facto, ninguém me lia, ninguém podia, mas ele estava a faze-lo, olhei-o de frente como sempre fazia para que desistissem a sequer traçar perfil meu, olhei-o como uma pantera ao ataque, em sinal de desafio. Em vez de desviar o olhar, tornou a sorrir, colocou as mão por baixo do seu queixo, os cotovelos nas suas pernas e arqueou o corpo para a frente e fitou-me de frente, estava a testar mais uma vez… Fiz o mesmo, repeti cada gesto cada movimento, cada certeza… Ao ver tal quadro a Sr.ª Omisha soltou uma risada _ “Óh meninos, então! Nenhum ganhará essa batalha.!”_ ao mesmo tempo como se algum de nós tivesse combinado com o outro, olhámos a Sr.ª Omisha. _”Sim… Nada ganharam assim, e sabem disso, no vosso intimo sabem-no.” Olhamo-nos agora de uma forma mais descontraída sem a tensão dos minutos anteriores, ambos na esperança que algum soubesse do que falava a Sr.ª Omisha, encolhi os ombros em sinal de desconhecimento, e ele com um sorriso de um velho amigo encolhe também os seus fazendo também um gesto de que a Sr.ª Omisha estaria louca.
“Meu menino, sou velha sei, mas não sou louca. Ai se fosses mais novo eu dizia-te. Olha isto hei! Um pirralho que eu mesma criei a mangar comigo! Não querem lá ver isto!”
Olhou-nos aos dois depois com um olhar tão sábio e ao mesmo tempo sinistro, a sua voz engrossara, não era só a Sr.ª Omisha a falar, mas algo mais que ela própria: “Vocês conhecem-se de há muitos mil anos atrás, agora a vossa missão é: Lembrarem-se…” Ficou a olhar para nós de forma séria durante uma eternidade de tempo, uns 15 minutos que se transformavam na mais longa espera, queria mais informação, queria saber o que ela tão lá no fundo guardava, agora sabia que o seu convite não tinha sido ao acaso, sabia que cada passo por ela feito tinham sido premeditados, ela sempre soubera o que eu estava ali no palácio de Cristais, não eram férias, nada de descanso, o seu convite era mais uma resposta talvez a duvidas dela mesma…
Tremia de pensar no que poderia ser. Sabia que o que quer que fosse me ligava ali ao palácio e ao neto dela. Não sei o que se passou, apenas que acordei já deitada no Palácio de Cristais, as estrelas já se reflectiam no tecto, não sabia ao certo como tinha ido ali parar, quem me colocara ali, seria tudo um sonho? Estaria louca? A minha cabeça rodopiava, as estrelas andavam mais lentas, mas mesmo assim, agitadas para o normal… Um barulho vinha do fundo do Palácio, mas nem forças tinha para me levantar, quem quer que fosse faria o que quisesse comigo, ali deitada ou não, não me iria levantar de nada me valeria.
“Já acordas-te!” Ecoava no ar… “Sim, respondi ao eco. E devo estar louca, oiço vozes.” Um som magnifico, suave de uma gargalhada ecoou ao meu próprio eco. “Não, não estás louca, mas vais ficar em breve…” Tremi seguidamente ao arrepio que me percorria o corpo todo. “Não ficarei.” Ecoei. “Sabes que isso nunca será verdade.” Novo eco.
Em desespero enterrei o rosto na almofada e chorei as lágrimas que prendia desde que ali chegara, chorei até que uns braços fortes me abraçavam, torturando-me a pele e o sentido da vida. Era quente aquele abraço, quente e confortável, mas ao mesmo tempo não sei de onde vinha, nem porque motivo estava ali.
“Não chores, vida. Por favor, não chores. Cheguei!”
Não queria saber de quem chegava, queria saber apenas o que se passava ali, se estavam todos doidos, se eu mesma estava doida, se por algum motivo os ET’s me tinham abduzido e feito experiencias, se eu mesma era uma experiencia, lembrei-me do filme com o Jim Carrey no qual a sua vida é passada em directo e orquestrada por um realizador que teve como infeliz ideia controlar um ser humano, seria eu também isso? Chorava cada vez mais, os afagos não me ajudavam, as festas na cabeça também não, soltavam-se cada vez mais lágrimas, até que as mesmas mãos que penteavam com calma os cabelos finos embaraçados, tentavam a todo o custo tirar-me os mesmos do rosto, limpar as lágrimas e sem mais depositar um beijo suave nos meus lábios, segurava-me o rosto entre os dedos longos, e olhava-me, em resposta abria os meus olhos em sinal de espanto. E mais um beijo caia do céu. Possivelmente estava louca, mas haviam também estrelas a cair ao mesmo tempo, caiam mesmo. “Sim, chovem estrelas hoje. Até elas te vêm beijar. Finalmente!”
“Desculpe, nada entendo!”
Abraçou-me, apertou-me contra o peito largo, impossível deixar de sentir o aroma da pele, daquele homem, era quase perfeito, faltava o quase…
“Espero-te desde os meus sete anos. Sabias?”
“Desculpa?”
“Sim, estou à tua espera desde os meus sete anos. À tua espera.”
“De mim?”
“Sim.”
“Mas… Nem sei quem és.”
“Eu e o Rodolfo. Ahahahah, aquele gato ama-te também não é?”
“Sim…”
Sorriu, Olhou-me nos olhos de uma forma tão intensa que uma lágrima grossa rolou pela face dele e uma outra pela minha. Não entendia nada, mas havia ali um sofrimento que não era meu, nem possivelmente dele, mas que o sentíamos intensamente por dentro, como se de alguma forma fosse realmente nossa, NOSSA aquela dor.
“Enquanto dormias a minha avó contou-me tudo.”
“Ahhhh…”
Um ahhhh mudo saia dos meus lábios, estava mesmo louca, assim que abrisse os olhos iria fazer as malas e sair daquela aldeia era uma promessa pessoal.
“Sonho-te desde pequeno. Nunca pensei que existisses, esperava por isso, mas… Com a idade as tuas atenções focam-se em outras prioridades que não os sonhos. Não esqueci a imagem que tinha, mas não te procurei mais. Se não fosse a minha querida avó nunca mais teria pensado no assunto. Ou talvez tivesse o destino se preocupado por mim, e colocaria frente a frente contigo.” Sorriu em direcção ao meu rosto, que se encontrava bem próximo do dele, abri os lábios, mas sem nada para dizer fechei-os da mesma forma…
“Estou cansado, querida!”
Depositou um beijo na minha testa, mesmo sem pedir, aninhou-se ao meu corpo, ficou ali a partilhar a chuva de estrelas, e depois fez-se noite para ambos… Dormíamos pesadamente pela noite e madrugada…

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